segunda-feira, 18 de julho de 2016

Tudo é bom motivo para matar um bebezinho...

Eugenia, Deficiência e Agenda Política Abortista Internacional


FELIPE DANA/ASSOCIATED PRESS
Luiza, who has her head measured at the Mestre Vitalino Hospital in Caruaru, Pernambuco state, Brazil, was born in October with a head just 11.4 inches in diameter, more than an inch below the range doctors define as healthy. Figura copiada de "The Huffington Post", Internet, http://www.huffingtonpost.com/entry/zika-virus-us-abortion-disability_us_56b2601be4b04f9b57d83192 

Na edição de maio de 2016 do American Journal of Bioethics, foi publicado um artigo para somar-se à hoste dos artigos abortistas à cata de justificativas para matar o próximo indefeso.[1]

Segundo o editorial, escrito a convite, o Brasil sofre forte tendência para o recrudescimento da legislação contra a legalização do aborto, justamente neste momento no qual o vírus Zika tem causado graves problemas em neonatos. O artigo também recorda aos leitores que o Brasil possui poucos recursos para auxiliar as famílias atingidas pelas mais graves complicações do vírus, que têm que cuidar de bebês com microcefalia. Por fim, avisam que leis contra o aborto podem reduzir a disponibilidade de tecido fetal para realizar pesquisas científicas em busca de novos tratamentos.

Páginas de notícia no Brasil informam que o número de casos de microcefalia confirmados ultrapassa mil e seiscentos numa avaliação feita em julho de 2016.[2] Os comentários numa página informativa são reveladores do nível moral de alguns leitores pró-aborto:

“Deveriam ter sido abortados. É um crime trazer para o mundo um ser que ficara preso a um corpo mal formado. Insensatos, insensíveis, irresponsáveis e hipócritas.”

“Se os pais assim o quiserem, deveria ser permitido.”

“Qual a expectativa de vida de um bebê desses?”

“Nenhuma cara, o jeito é esperar ele morrer mesmo infelizmente, microcefalia não há solução.”

“Corrigindo o bebe pode viver sim, mas vai ter uma vida totalmente dependente de outra pessoa.”

“Espero do fundo do meu coração que esse número venha triplicar e os brasileiros parem de fazer filhos kk.”


Há todo um questionamento em relação à mentalidade utilitarista e hedonista que motiva a indisposição de cuidar de crianças imperfeitas ou, como diriam os nazistas, de “comedores inúteis”. Essa mentalidade que destina parcelas inadequadas da população ao extermínio por sucção e desmembramento ou, em outras épocas, por câmaras de gás, fornos crematórios e fuzilamento, sempre esteve presente em nossa história, representando a antítese de nossos valores fundacionais ligados à religião cristã e à percepção da Dignidade Humana. Remeto o leitor à obra de Benjamin Wiker para mais informações sobre esse duelo de cosmovisões que já dura mais de dois mil anos.[3]

Contudo, gostaria de chamar atenção sobre outros aspectos.

Primeiro: seria terrivelmente impreciso afirmar que há um recrudescimento das leis anti-abortistas no Brasil. Nosso país sempre foi maciçamente contrário à legalização do aborto voluntário e, recentemente, seguindo a agenda internacional de controle de natalidade e morticínio de fetos, criou dispositivos facilitadores para o abortamento indiscriminado, como aquele chamado de “Atenção Humanizada ao Aborto”.[4] O que há, realmente, é a maior consciência das constantes e insistentes tentativas de engenharia social da agenda cultural de esquerda no país e uma resposta de segmentos religiosos e de grupos que apoiam a vida do bebê e os valores mais prezados pela população comum.

O que há no Brasil é o aumento da crítica feita às violentas iniciativas abortistas, que sempre se caracterizaram por muita maquiagem politicamente correta e por termos eufemísticos como “pró-escolha”, “direito de decidir” e “direitos reprodutivos”, criados há décadas por abortistas que lucravam pesado com a morte alheia. Não sou eu que afirmo isto, é o próprio rei do aborto, Bernard Nathanson, criador de muitos desses termos especialmente desenvolvidos para comover e confundir a população desprevenida contra manipulação psicológica e auxiliar na aprovação de leis abortistas. Nathanson, posteriormente, se arrependeu de seus crimes e passou a defender a vida dos fetos e bebês.[5]

Segundo: há muitos recursos no Brasil! Somos um dos países mais ricos do mundo - e com maior carga tributária. O problema é a altíssima carga parasitária de nossa elite política corrompida até à medula. O dinheiro público simplesmente “desaparece” nos bolsos de nossa elite de esquerda aliada aos megaempresários que topam entrar na dança da malandragem institucionalizada. Porém, considerando o mercado milionário do aborto e o rótulo progressista que o acompanha, os olhos da (des)”Intelligentsia”[6] tupiniquim brilham.

E terceiro: praticar um ato moralmente errado, ou até mesmo questionável, justificado por um bem potencial, como os possíveis avanços em tratamentos com o uso de pedaços de bebês abortados para pesquisa, não é eticamente aceitável fora de um parâmetro maquiavélico e diabólico no qual o mais forte decide usar o mais frágil por meio do extermínio.

Muitos apelam aos possíveis tratamentos; contudo, não lembram de que há outras possíveis ferramentas para o desenvolvimento de novos tratamentos, como a pesquisa de células-tronco de adultos. Poucos lembram também de que ainda há muita expectativa e poucos resultados concretos, ou sequer cogitam as complicações do uso de células-tronco fetais, como o desenvolvimento de câncer no receptor. E isso sem falar no assustador mercado clandestino de pedaços de bebês e fetos, praticado pela megaempresa abortista Planned Parenthood.[7]

O artigo publicado no famoso periódico de bioética afirma que até o Papa concordou em fazer anticoncepção em situações como a do vírus Zika se espalhando. Dizem que evitar gravidez não é mal absoluto. Isto não passa de um truque de palavras. É uma mutatio controversiae, uma mudança de assunto.[8] O artigo defende o aborto, não a anticoncepção. E a permissão de uma coisa (contracepção) é bem diferente da outra (aborto).

E, por fim, o artigo conclui fazendo um apelo para que homens e mulheres busquem respostas na opinião de pesquisadores biomédicos sem a interferência de uma “agenda política”.

Advogam a disponibilização do abortamento. Negar o direito à matança de uma prole deficiente seria, conforme os autores, ação moralmente inaceitável. Nisto, repetem o discurso orwelliano da Organização das Nações Unidas, onde matar fetos e bebês tornou-se um “direito humano”.[9]

Dentro da perspectiva hedonista e naturalista, considerar inaceitável que pais cuidem de crianças deficientes é uma atitude compreensível, assim como é completamente compreensível, na perspectiva caridosa e transcendental – que, aliás, fundou nossa civilização -, que pais cuidem de suas crianças em qualquer situação considerando-as dádivas de Deus (ou do destino, para quem não acredita em Deus), mesmo quando imperfeitas em diferentes graus do nosso, visto que todos nós temos imperfeições. É claro que ambas são compreensíveis, mas a primeira opção é moralmente muito inferior e relaciona-se aos hedonistas mais medíocres e menos caridosos.

Quanto ao manjado e boboca discurso da agenda política que move um discurso, não é nenhuma novidade. Esse artigo do American Journal of Bioethics repete um padrão já cansativo: pessoas com agendas progressistas escandalosamente politizadas projetam naqueles que discordam de suas “iluminadas” opiniões os desejos políticos inconfessáveis de uma imaginada agenda obscurantista.  Assim também foi feito por Alta Charo em um artigo publicado no famoso periódico New England Journal of Medicine, que cada vez mais parece um panfleto político, embora publique conteúdo científico de valor quando não se pronuncia sobre questões humanísticas.[10]

Nossos bioprogressistas, enterrados até ao pescoço em suas próprias agendas políticas, acusam a todos de falta de objetividade científica do alto de suas perspectivas intensamente subjetivas e desprovidas do mínimo de empatia necessário para mover um debate de qualidade.

Convido o leitor a visitar a página da National Advocates for Pregnant Women, organização política proponente do aborto na qual milita Mary Faith Marshall, uma das autoras do artigo que critico.[11] Lá qualquer um poderá conferir o grau de imparcialidade da autora que acusa outros de moverem “agendas”.

Diante do exemplo de tantas famílias brasileiras que, movidas pelo mais sincero sentimento de amor ao próximo, recusam-se a matar sua prole e cuidam de seus bebês por dias, semanas ou até mesmo anos, haja o que houver, mesmo na pobreza e na ausência de auxílio adequado do governo – sempre disposto a ajudar criminosos e sempre ignorando inocentes -, só podemos nos sentir humildes e admirados, e oferecer nossa compreensão e incondicional ajuda para que vivam e cumpram suas melhores virtudes.

E, no fim, devemos responder qual tipo de civilização desejamos legar aos nossos filhos e netos. Será uma civilização que eliminará seus fracos e exaltará seus fortes? Ou será uma civilização que exaltará suas virtudes e sua fortaleza ao cuidar dos mais fracos?

Prof. Dr. Hélio Angotti Neto é Coordenador do Curso de Medicina do UNESC, Diretor da Mirabilia Medicinæ (Revista internacional em Humanidades Médicas), Membro da Comissão de Ensino Médico do CRM-ES, Visiting Scholar da Global Bioethics Education Initiative do Center for Bioethics and Human Dignity, Membro do Comitê de Ética em Pesquisa do UNESC e criador do Seminário de Filosofia Aplicada à Medicina (SEFAM).







[1] HARRIS, Lisa H; SILVERMAN, Neil S; MARSHALL, Mary Faith. ‘The Paradigm of the Paradox: Women, Pregnant Women, and the Unequal Burdens of the Zika Virus Pandemic’. In: American Journal of Bioethics, Vol 16(5), 2016, p.1-4.

[2] GLOBO.COM Bem Estar. Brasil tem 1.687 casos confirmados de microcefalia, diz ministério. 13 de julho de 2016. Internet, http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2016/07/brasil-tem-1687-casos-confirmados-de-microcefalia-diz-ministerio.html

[3] WIKER, Benjamin. Hedonismo Moral: Como nos tornamos hedonistas. São Paulo: Paulus, 2011.

[4] MINISTÉRIO DA SAÚDE. Norma Técnica: Atenção Humanizada ao Abortamento. Série Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos vol 4. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2005. Internet, http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_humanizada.pdf

[5] NATHANSON, Bernard N. The Hand of God: A Journey from Death to Life by the Abortion Doctor Who Changed His Mind. Washington, DC: Regnery Publishing, Inc., 1996; NATHANSON, Bernard N. Aborting America:  A Doctor’s Personal Report on the Agonizing Issue of Abortion. Fort Collins, CO: Life Cycle Books, 1979.

[6] Do russo интеллигенция, refere-se a um grupo remunerado de pessoas envolvidas em trabalho intelectual complexo e criativo direcionado ao desenvolvimento e à disseminação de uma cultura específica, isto é, à engenharia social por meio da cultura.

[7] The Center for Medical Progress. PLANNED PARENTHOOD STILL #GUILTY OF SELLING BABY PARTS FOR PROFIT ONE YEAR AFTER VIDEOS #PPSELLSBABYPARTS. Internet, http://www.centerformedicalprogress.org/2016/07/planned-parenthood-still-guilty-of-selling-baby-parts-for-profit-one-year-after-videos-ppsellsbabyparts/

[8] SCHOPENHAUER, Arthur. Como Vencer um Debate Sem Precisar Ter Razão. Rio de Janeiro: Topbooks, 2003.

[9] LA GACETA. La ONU califica el aborto de derecho humano. Internet, http://gaceta.es/noticias/onu-reconoce-aborto-derecho-humano-12022016-1436

[10] CHARO, Alta. Fetal Tissue Fallout. New England Journal of Medicine, 373(10), September 3, 2015, p. 890-891. Remeto o leitor à crítica feita por mim no texto: Espantalhos, Nazistas e Coerência Ética. Internet, http://medicinaefilosofia.blogspot.com.br/2015/09/espantalhos-nazistas-e-coerenciaetica.html