domingo, 19 de maio de 2019

REGRAS DA EXPRESSÃO - LAVELLE

REGRAS DA EXPRESSÃO – LOUIS LAVELLE


“Não se deve rejeitar nem desprezar a aparência, que é também a manifestação ou a expressão. Pois há solidariedade entre a aparência e o que ela mostra.

“Exige-se que a aparência seja fiel, o que já nos obriga a uma disciplina estrita; pois no esforço que fazemos para torná-la fiel está a própria ideia que buscamos circunscrever, ou seja, formar. E é admirável que aqui a palavra “definição” não pareça designar nada mais que a proposição pela qual eu formulo o sentido da ideia por meio de palavras, mas que é também o ato pelo qual tomo posse dele e o crio dentro de mim. 

“Uma ideia tem necessidade de se realizar no exterior para poder sê-lo no interior, porque do contrário ela vacila e se extingue. Ela precisa tomar forma para ser, e é esta forma que a faz ser. Há que dizer precisamente que ela é informe quando não consegue dar-se uma forma.

“Mas é preciso que essa fidelidade pela qual se busca obter a conformidade, ou seja, a identidade entre a ideia e a forma, ou seja, essa fidelidade pela qual se busca dar um corpo à ideia que também lhe dá a existência e a vida, é preciso que ela se transforme para nós em beleza. Pois a exigência da beleza na forma é o testemunho na própria ideia desse valor secreto que a torna digna ao mesmo tempo de ser pensada, querida e amada.”

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Orwell, em seu romance 1984, falava a respeito de só se poder realmente pensar sobre aquilo que se podia falar. Sua sociedade imaginária (muito semelhante a certas sociedades bem reais movidas por ideologias como o socialismo), controlava o pensamento de seus habitantes por meio do estrito controle da terminologia empregada e pela manipulação da história. Lavelle concordaria com George Orwell,, ao que tudo indica, pois reconhece que um pensamento sem forma permanece em grande parte como um potencial a ser despertado plenamente, como um prisioneiro no fundo da alegórica caverna de Platão, imerso em trevas olhando as sombras, embora apto a um dia sair ao ar livre e contemplar o sol.

E quem nunca passou pela sutil experiência de tentar explicar algo e terminar por saber ainda mais a respeito daquilo que explicou após terminar a exposição? Quem nunca aprendeu algo completamente novo ao enunciar em voz alta seus pensamentos a outrem? A forma expressiva, em harmonia com a ideia, forma um conjunto ainda mais rico na concretude de sua manifestação, embora abra mão do potencial prévio de expressão. Eis uma relação interessante entre a forma cristalizada e vazia e o conteúdo potencial informe e silencioso da ideia ainda não enunciada. Uma expressividade esteticamente bela e eficaz anuncia o conteúdo sem lhe tolher certo potencial de expansão e inovação.

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“Não devemos buscar tornar-nos semelhantes a um espelho que achata as coisas e termina por nos cegar. É aquele que traz no espírito os maiores pensamentos que percebe o real com mais esplendor e relevo.”