sábado, 7 de outubro de 2017

EXCERTOS DE “O MÉDICO VIRTUOSO E A ÉTICA DA MEDICINA”

EXCERTOS DE “O MÉDICO VIRTUOSO E A ÉTICA DA MEDICINA”

Considerais de qual nobre semente nascestes: Vós não fostes criados para viverdes como bestas, mas para perseguirdes a virtude e o conhecimento.

Dante, Inferno 26, 118-120

Edmund D. Pellegrino

Virtude implica um traço do caráter, uma disposição interna, habituada a buscar a perfeição moral, a viver a própria vida em acordo com a lei moral, a alcançar o equilíbrio entre a nobre intenção e a justa ação.

Em praticamente todas as perspectivas, uma pessoa virtuosa é aquela que podemos confiar que agirá habitualmente de forma boa – com coragem, honestidade, justeza, sabedoria e temperança. Ela está compromissada em ser uma boa pessoa e a buscar a perfeição em sua vida privada, profissional e comunitária. É alguém que agirá bem até mesmo quando não houver ninguém para aplaudir, simplesmente porque agir de outra forma é violar o que é ser uma boa pessoa. Nenhuma sociedade civilizada pode perseverar sem um número significativo de cidadãos comprometidos com este conceito de virtude. Sem tais pessoas, nenhum sistema geral de ética poderia transcender os perigos do interesse egoísta.

Contudo, qualquer tentativa de se definir um médico virtuoso ou uma ética baseada em virtudes para a medicina deve oferecer uma definição o que é o bem para o paciente.

Esse objetivo (o bem do paciente) é central a qualquer noção de virtude peculiar à medicina como prática.

Todos os códigos profissionais médicos são erigidos sobre um sistema tríplice de obrigações relativas ao papel especial que médicos têm em sociedade. Em ordem ascendente de sensibilidade ética são essas obrigações: prezar as leis da terra, prezar os direitos e cumprir os deveres e, finalmente, praticar a virtude.

O médico virtuoso não age com base no que ele acha ser bom de forma irrazoável ou sem crítica. Sua ação é ordenada em acordo com a “reta razão” que Aristóteles e Tomás de Aquino consideraram essencial à virtude.

Uma ética baseada em virtudes é inerentemente elitista, pois a adesão a ela demanda mais da pessoa que aspira à virtuosidade do que a moralidade prevalente.

Não importa o quanto uma sociedade caia. As pessoas virtuosas sempre serão faróis que iluminarão o caminho de volta à sensibilidade moral. Médicos virtuosos são os faróis que mostram o caminho de volta à credibilidade moral de toda a profissão médica.

Precisamos resgatar a coragem para falar sobre caráter, virtude e perfeição em viver uma boa vida. Precisamos encorajar aqueles que desejam se dedicar a um padrão mais elevado de altruísmo. Precisamos de coragem também para aceitar o óbvio abismo que existe entre aqueles que enxergam e sentem os imperativos altruístas da medicina e aqueles cegos a essa dimensão.

Esquecemos de que os médicos, desde o início da profissão, dedicavam-se a diferentes valores e virtudes. Basta lembrar que o Juramento de Hipócrates era o juramento de médicos da escola pitagórica num tempo em que a maioria dos médicos gregos se dedicava a uma ética de ofício (e não a uma ética profissional).

A ilusão de que todos os médicos compartilham uma devoção comum a um grupo elevado de princípios morais trouxe prejuízo à medicina por elevar as expectativas a respeito do que alguns profissionais poderiam ou não cumprir.

PELLEGRINO, Edmund D. “The Virtuous Physician and the Ethics of Medicine”. In: SHELP, Earl E. Virtue and Medicine: Exploration in the Character of Medicine (Philosophy and Medicine Series 17). D. Reidel Publishing Company: 1985, p. 243-255.

Tradução e Seleção: Hélio Angotti Neto
07 de outubro de 2017, Colatina - ES