XI. A medicina enquanto guardiã das informações do paciente
XI
- O médico guardará sigilo a respeito das informações de que detenha conhecimento
no desempenho de suas funções, com exceção dos casos previstos em lei.
Desde
a antiguidade, o médico buscou o estabelecimento de uma relação de confiança
com seu paciente. Tal necessidade de confiança para o adequado estabelecimento
do laço terapêutico tem caráter quase que sagrado. No Juramento de Hipócrates o
médico promete que
(...)
o que vir e ouvir, durante o tratamento, sobre a vida dos homens, sem relação
com o tratamento, e que não for necessário divulgar, calarei, considerando tais
coisas segredo.[1]
É
interessante notar que, desde os tempos hipocráticos, há a concepção de que
algumas coisas devem ser reveladas por necessidade, assim como se revela no
atual princípio do Código de Ética Médica, onde se fala acerca de casos
previstos em lei.
O
princípio do sigilo garante o exercício livre, adequado e isento da medicina,
por meio da possibilidade de que o paciente revele tudo o que necessita para
promover seu próprio bem sem preocupar-se com a possibilidade de ser traído
pelo profissional médico em seu momento de maior fragilidade.
Em
relação às exceções à regra, há dois casos previstos em lei.
O
primeiro é a necessidade de revelar doenças de notificação compulsória,
definidas pela Lei nº 6.259/75. O segundo é uma situação na qual o médico é testemunha
de crime cometido por alguém que, por coincidência, também é seu paciente.
Denunciar o crime não é ato envolvido diretamente com a relação terapêutica.
Sobre
quem está preso ao sigilo, deve ser salientado que todos os responsáveis pela
situação terapêutica, incluindo a equipe multidisciplinar e a administração de
clínicas e hospitais, estão comprometidos com o sigilo, e cabe ao médico
orientar toda a equipe, incluindo seus alunos, a respeito da obrigatoriedade do
sigilo e de sua importância.
O
dever de manter o sigilo também deve ser seguido pelo médico quando exerce
funções de perito ou auditor, evitando a exposição constrangedora e
desnecessária da pessoa fragilizada.
Uma
situação que tem gerado muito transtorno para pacientes e médicos é o código
internacional da doença escrito em atestados a pedido dos pacientes e por
orientação de seu local de trabalho. O paciente muitas vezes solicita ao médico
que escreva o “tal CID”, sem saber exatamente que o código revela seu
diagnóstico nosológico. Muitos médicos que anotaram o CID em um atestado já
foram processados por quebra do sigilo médico. Qual caminho seguir?
A
primeira opção é explicar ao paciente o que significa o CID e qual o código que
será anotado no atestado, para ver se há concordância. Se o paciente concordar,
ele deve assinar o atestado junto com o médico e escrever que o CID foi
revelado a pedido.
Uma
segunda opção é explicar o que significa o CID ao paciente e inserir um CID
genérico de consulta médica sem revelação do diagnóstico do paciente.
O
paciente tem a opção de permitir a quebra do sigilo profissional, desde que
seja capaz e maior de idade. Pacientes vulneráveis – menores ou deficientes –
não podem demandar do médico a quebra do sigilo.
O
médico também é responsável também pela documentação que contém dados dos
pacientes de uma clínica ou instituição de saúde. No caso do arquivo pessoal de
um médico que vem a falecer sem herdeiro médico que prosseguirá guardando o
arquivo, deverá ser incinerado por pessoa de convivência direta, familiares ou secretária
particular. Supõe-se que os dados necessários ao paciente tenham sido
requisitados quando o médico vivia.[2]
[1] Fontes
consultadas: (1) RIBEIRO Jr., Wilson A. Juramento. In: CAIRUS, Henrique F.,
RIBEIRO Jr., Wilson A. Textos
Hipocráticos: o Doente, o Médico e a Doença. Rio de Janeiro: Editora
Fiocruz, 2005, p. 151-167; (2) JONES, W.H.S. (Tradutor). Hippocrates Volume I (Loeb Classical Library). Cambridge
& London: Harvard University Press, 1923, p.289-302.
[2]
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. PROCESSO-CONSULTA CFM Nº 3120/94. Internet, http://www.portalmedico.org.br/pareceres/cfm/1995/31_1995.htm